A VIDA É UM BRINCO
Entrei no táxi e levei um susto quando identifiquei que o motorista era surdo-mudo. Não vou mentir: levei um susto. Com todo o preconceito que ainda havia guardado em mim.
Ele não me ouviu gritando da janela que já desceria, não lia os lábios, não escutou quando quis mudar a rota bruscamente, tampouco reconheceu as buzinadas dos carros. Fiquei, diante do seu silêncio curioso e ávido, absolutamente despreparado. Um bebê grande sem saber como me comportar.
Eu não esperava receber tal motorista, ninguém espera a diferença que quebra a rotina automática.
Idoso ou portador de necessidades especiais ou cadeirante, desconheço o sofrimento de quem precisa de uma cidade diferente do que a minha, desconheço a dificuldade da simplicidade e o quanto tenho a obrigação de ser mais educado e atento. Grosseria é não ser humilde a ponto de sair do seu confortável ponto de vista.
No táxi, ele se mostrava um homem elegante da palavra escrita. Ele dependia da palavra no papel e na tela para trabalhar: meu gêmeo.
Pediu por favor que escrevesse o endereço em seu celular e seguiu rigorosamente a rota. Eu me envergonhei do que fiz na adolescência.
Não trocamos nenhuma impressão durante a viagem inteira . Ele me olhou com ternura, um olhar de quem atravessa a longa avenida da minha indiferença. Apertou a sua orelha direita para apontar a beleza da lua. Em retribuição, apertei com os dedos a minha orelha direita. Colocamos os dois naquela hora os brincos invisíveis da amizade. A vida é um brinco para quem escuta o coração.....
Fabrício Carpinejar..