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Minha filha, Anna Luiza....

DESCULPA-ME A TERNURA

Enternece-me pensar que estás aí,

não força de trabalho desigual

nem vida à pressa,

mas minha amiga.



Talvez as palavras que te digo

me transpareçam classe,

talvez nem te devesse dizer nada.

Porque és a mão que ampara o meu silêncio,

a minha filha, o meu cansaço

— à custa do teu cansaço, da tua filha,

do teu silêncio.



Não há homens-a-dias neste mundo,

mas tantas como tu,

a segurar nas mãos e no sorriso

algumas como eu.



Entraste há pouco a perguntar

se eu tinha febre

— a louça por lavar nas tuas mãos,

aspirando o cansaço dos meus ombros,

nos teus ombros o cansaço de mim

e o cansaço de ti.





Desculpa os meus silêncios,

o falar-me contigo como com mais ninguém,

desculpa o tom sem pressa

— e o meu dinheiro que não chega a nada,

comprando o teu trabalho

(o teu sorriso)



ANA LUÍSA AMARAL, Às Vezes o Paraíso, (2ª edição), Quetzal Editores, Lisboa, 1998: 72, 73





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